Carta 23: Sobre a verdadeira alegria que vem da filosofia

A carta 23 discorre sobre a distinção entre a alegria falsa e a verdadeira. Sêneca começa contando a Lucílio que deseja escrever-lhe sobre as coisas que importam, sem perder tempo falando do tempo ou outras trivialidades das quais as pessoas falam quando não têm nada a dizer. Ele então vai direto ao ponto:

Você pergunta qual é o fundamento de uma mente sã? É, não encontrar satisfação em coisas inúteis. Eu disse que era o fundamento; é realmente o pináculo. Chegamos às alturas quando sabemos o que é que nos alegra e quando não colocamos nossa felicidade sob controle externo. ” (XXIII, §1-2)

Essa, é claro, é uma versão da dicotomia estoica do controle: não controlamos os externos, por isso é tolice depositar nossa felicidade neles. A frase de Sêneca, “Eu disse que era o fundamento; é realmente o pináculo.“, na verdade destaca a ideia de que encontrar alegria na solidez dos próprios julgamentos, em oposição à aquisição de coisas externas, é um objetivo importante do treinamento estoico e, de fato, o auge a ser alcançado.

Acima de tudo, meu caro Lucílio, faça deste seu negócio: aprenda a sentir alegria.” (XXIII, §3)

Normalmente, não precisaríamos aprender a sentir alegria, é uma emoção humana natural. O fato de termos que “aprender” como sentir alegria, entretanto, está perfeitamente de acordo com o princípio estoico de que os sentimentos básicos têm valor neutro e devem ser avaliados por nossa faculdade de julgamento, que tem o poder de dar ou retirar consentimento a tais sentimentos.  Isso parece bastante severo, Sêneca admite que o prazer é uma coisa boa (no sentido de ser um indiferente preferido), mas também está advertindo de que o prazer tem uma tendência a assumir o controle, distraindo-nos de atividades mais importantes. O que buscar, exatamente? Vem a resposta:

Você me pergunta qual é o verdadeiro bem, e de onde deriva? Digo-o: vem de uma boa consciência, de propósitos honrosos, de ações corretas, de desprezo dos presentes da fortuna, de um modo de vida equilibrado e tranquilo que trilha apenas um caminho.” (XXIII,§7)

O problema é que muitos de nós levam muito tempo para perceber isso, e alguns de nós nunca percebem isso. É por isso que Sêneca conclui a carta com estas palavras memoráveis:

Alguns homens, na verdade, só começam a viver quando é hora de deixarem de viver… alguns homens deixam de viver antes de começarem. ”(XXIII,§11)

XXIII. Sobre a verdadeira alegria que vem da filosofia

Saudações de Sêneca a Lucílio.

1. Você acha que eu vou escrever-lhe como a temporada de inverno tem nos tratado com gentileza, que aliás foi uma estação curta e suave, ou que primavera desagradável estamos tendo, tempo frio fora de época, e todas as outras trivialidades que as pessoas escrevem quando estão sem assunto? Não; vou transmitir algo que pode ajudar tanto a você como a mim. E o que deve ser esse “algo”, senão uma exortação à solidez da mente? Você pergunta qual é o fundamento de uma mente sã? É, não encontrar satisfação em coisas inúteis. Eu disse que era o fundamento, é realmente o pináculo.

2. Chegamos às alturas quando sabemos o que é que nos alegra e quando não colocamos nossa felicidade sob controle externo. O homem que é incitado pela esperança de qualquer coisa, embora a tenha ao alcance, embora a tenha em fácil acesso e embora suas ambições nunca o tenham enganado, é perturbado e inseguro de si mesmo.

3. Acima de tudo, meu caro Lucílio, faça deste seu negócio: aprenda a sentir alegria. Você acha que agora estou roubando-lhe muitos prazeres quando eu tento acabar com os presentes da Fortuna, quando eu aconselho a evitar a esperança, a coisa mais doce que alegra nossos corações? Pelo contrário, eu não desejo nunca que você seja privado de alegria. Eu a teria inata em sua casa e ela nascerá lá apenas se estiver dentro de você. Outros objetos de conforto não enchem o peito de um homem, eles apenas suavizam a testa e são inconstantes, a menos que você acredite que aquele que ri tem alegria. A própria alma deve ser feliz e confiante, elevada acima de todas as circunstâncias.

4. Alegria real acredite, é uma questão muito séria. Pode alguém, você acha, menosprezar a morte com um semblante despreocupado ou com uma expressão jovial e alegre, como nossos jovens janotas estão acostumados a dizer? Ou então, pode abrir a porta para a pobreza ou restringir seus prazeres ou contemplar a tolerância da dor? Aquele que pondera estas coisas em seu coração está realmente cheio de alegria, mas não é uma alegria bem disposta. É apenas essa alegria, porém, da qual eu gostaria que você se tornasse o dono, pois nunca o deixará na mão quando encontrar sua fonte.

5. O rendimento das minas medíocres fica na superfície; naquelas que são realmente ricas, as veias emboscam-se profundamente e elas trarão retornos mais generosos para aquele que mergulha continuamente. Assim também são bugigangas que deleitam a multidão comum, pois proporcionam apenas um prazer superficial, colocado somente como um revestimento, sendo este como uma alegria banhada, a qual falta base real. Mas a alegria de que falo, aquela a que estou me esforçando para conduzi-lo, é algo sólido, revelando-se mais plenamente à medida que você nela penetra.

6. Portanto, peço-lhe, meu querido Lucílio, faça a única coisa que pode tornar-lhe realmente feliz: despreze todas as coisas que brilham exteriormente e que são oferecidas a você ou a qualquer outro, olhe para o verdadeiro bem e alegre-se apenas naquilo que vem de seu depósito. E o que quero dizer com “seu depósito”? Eu quero dizer de seu próprio eu, que é a melhor parte de você. O corpo frágil também, embora não consigamos fazer nada sem ele, deve ser considerado apenas necessário e não tão importante. Ele nos envolve em prazeres fúteis, de curta duração, logo a serem lamentados. A menos que sejamos ajuizados por um extremo autocontrole, tais prazeres serão transformados em antagônicos. Isso é o que quero dizer: o prazer, a menos que tenha sido mantido dentro dos limites, tende a nos precipitar no abismo da tristeza. Mas é difícil manter limites dentro daquilo que você acredita ser bom. O verdadeiro bem pode ser cobiçado com segurança.

7. Você me pergunta qual é o verdadeiro bem e de onde ele deriva. Digo-o: vem de uma boa consciência, de propósitos honrosos, de ações corretas, de desprezo pelos presentes da Fortuna, de um modo de vida equilibrado e tranquilo que trilha apenas um caminho. Para os homens que saltam de um propósito para outro, ou sequer saltam, mas são carregados por uma espécie de aventura, como podem essas pessoas vacilantes e instáveis possuírem qualquer bem que é fixo e duradouro?

8. Existem poucos que controlam a si mesmos e seus negócios por um propósito direcionado. O restante não prossegue, eles são simplesmente varridos, como objetos flutuando em um rio. E desses objetos, alguns são retidos por águas lentas e são transportados suavemente, outros são despedaçados por uma corrente mais violenta, alguns, que estão mais próximos da margem, são deixados lá onde a correnteza afrouxa e outros são levados para o mar pelo avanço da correnteza. Portanto, devemos decidir o que desejamos e manter-nos firmes nesse propósito.

9. Agora é a hora de pagar minha dívida. Eu posso dar-lhe um provérbio de seu amigo Epicuro e assim livrar esta carta de sua obrigação. “É lamentável estar-se perpetuamente começando a vida.”101 Ou outra, que talvez expressará melhor o significado: “Vivem mal aqueles que estão sempre começando a viver”.

10. Você está certo em perguntar por que. O ditado certamente precisa de um comentário. O que se passa é que a vida de tais pessoas é sempre incompleta. Mas um homem não pode estar preparado para a aproximação da morte se ele acaba de começar a viver. Precisamos tornar nosso objetivo já ter vivido o suficiente. Ninguém pensa que tenha feito isso, se está sempre na etapa de planejar sua vida.

11. Você não precisa pensar que há poucos deste tipo, praticamente todos são de tal cunho. Alguns homens, na verdade, só começam a viver quando é hora de deixarem de viver. E se isso lhe parece surpreendente, acrescento o que mais o surpreenderá: alguns homens deixaram de viver antes mesmo de terem começado.

Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.


Carta 1: Sobre aproveitar o tempo

Na primeira carta Sêneca fala o que considera o mais importante, aproveitar bem nosso tempo.  Faz um alerta para não deixarmos tudo para o fim da vida, quanto “é demasiado tarde para gastarmos quando chegarmos à raspa do tacho. Daquilo que permanece no fundo, a quantidade é pouca e a qualidade é vil.

(Imagem: La persistencia de la memoria por  Salvador Dalí)


Carta 1: Sobre aproveitar o tempo

Saudações de Sêneca a Lucílio.

1. Continue a agir assim, meu querido Lucílio: liberte-se por conta própria; poupe e aproveite seu tempo, que até recentemente tem sido retirado a força de você ou furtado ou simplesmente escapado de suas mãos. Faça-se acreditar na verdade de minhas palavras: que certos momentos são arrancados de nós, que alguns são removidos suavemente e que outros fogem além de nosso alcance. O tipo mais desgraçado de perda, no entanto, é aquele devido ao descuido. Ademais, se você prestar atenção ao problema, você verá que a maior parte de nossa vida passa enquanto estamos fazendo coisas desagradáveis, uma boa parte enquanto não estamos fazendo nada e tudo isso enquanto estamos fazendo o que não deveríamos fazer.

2. Qual homem você pode me mostrar que coloca algum valor em seu tempo, que dá o devido valor a cada dia, que entende que está morrendo diariamente? Pois estamos equivocados quando pensamos que a morte é coisa do futuro; a maior parte da morte já passou. Quaisquer anos atrás de nós já estão nas mãos da morte. Portanto, Lucílio, faça como você me escreve que você está fazendo: mantenha cada hora ao seu alcance. Agarre a tarefa de hoje e você não precisará depender tanto do amanhã. Enquanto estamos postergando, a vida corre.

3. Nada, Lucílio, é nosso, exceto o tempo. A natureza nos deu o privilégio desta única coisa, tão fugaz e escorregadia que qualquer um pode esbulhar tal posse. Que tolos esses mortais são! Eles permitem que as coisas mais baratas e inúteis, que podem ser facilmente substituídas, sejam contabilizadas depois de terem sido adquiridas; mas nunca se consideram em dívida quando recebem parte dessa preciosa mercadoria, o tempo! E, no entanto, o tempo é o único empréstimo que nem o mais agradecido destinatário pode pagar.

4. Você pode desejar saber como eu, que prego a você, estou praticando. Confesso francamente: meu saldo em conta corrente é como o esperado de alguém generoso mas cuidadoso. Não posso vangloriar-me de não desperdiçar nada, mas pelo menos posso lhe dizer o que estou desperdiçando, a causa e a maneira de desperdício; posso lhe dar as razões pelas quais sou um homem pobre. Minha situação, no entanto, é a mesma de muitos que são reduzidos à miséria sem culpa própria: todos os perdoam, mas ninguém vem em seu socorro.

5. Qual é o estado das coisas, então? É isto: eu não considero um homem como pobre, se o pouco que lhe resta o é suficiente. Contudo, aconselho-o a preservar o que é realmente seu; e nunca é cedo demais para começar. Pois, como acreditavam os nossos antepassados, é demasiado tarde para gastarmos quando chegarmos à raspa do tacho. Daquilo que permanece no fundo, a quantidade é pouca e a qualidade é vil.

Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.

Carta 69: Sobre estar quieto e Inquietação

Após as resenhas das Meditações de Marco Aurélio, voltamos com a análise das cartas de Sêneca.

Na Carta 69 volta a discussão o tempo de devemos dedicar ao estudo, o problema com mudanças constantes e as distrações causadas pela busca do prazer.

Vale lembrar da Carta 28, onde Sêneca questiona:

“Você pergunta por que tal fuga não o ajuda? É porque você foge acompanhado de você mesmo. Você deve deixar de lado os fardos da mente; até que você faça isso, nenhum lugar irá satisfazê-lo.” (XXVIII.2)

Diz que devemos aplicar o remédio da filosofia longamente, sem interrupção, mantendo a tranquilidade da alma.  Afirma que a mudança traz de volta anseios esquecidos, e que aquele que se afasta do mundo dos homens ocupados, não deve se colocar como alvo da tentação:

“Assim como aquele que tenta livrar-se de um amor antigo deve evitar todo lembrete da pessoa que antes era querida (pois nada cresce tão facilmente como o amor), da mesma forma, aquele que deixaria de lado o seu desejo por todas as coisas que costumava desejar tão apaixonadamente, deve afastar olhos e ouvidos dos objetos que abandonou.” (LXIX, 3)

Conclui a carta falando  da morte, e instiga Lucílio a não temê-la.

(Imagem Diógenes em busca de um homem honesto por Jacob Jordaens)


LXIX. Sobre estar quieto e Inquietação

Saudações de Sêneca a Lucílio.

  1. Eu não gosto que você mude sua sede e debande de um lugar a outro. Minhas razões são, primeiro, que tal emigração frequente signifique um espírito instável. E o espírito não pode, através do retiro, crescer em harmonia, a menos que tenha cessado sua curiosidade e suas andanças. Para ser capaz de manter seu espírito sob controle, você deve primeiro parar a fuga constante do corpo.
  2. A minha segunda razão é que os remédios que são mais úteis são aqueles que não são interrompidos. Você não deve permitir que sua tranquilidade, ou o esquecimento a que você consignou sua vida anterior, serem penetrados. Dê a seus olhos tempo para desaprender o que eles viram, e seus ouvidos para se acostumar a palavras mais saudáveis. Sempre que você se move ao exterior você encontrará, mesmo quando passa de um lugar para outro, coisas que trarão de volta seus anseios antigos.
  3. Assim como aquele que tenta livrar-se de um amor antigo deve evitar todo lembrete da pessoa que antes era querida (pois nada cresce tão facilmente como o amor), da mesma forma, aquele que deixaria de lado o seu desejo por todas as coisas que costumava desejar tão apaixonadamente, deve afastar olhos e ouvidos dos objetos que abandonou. As emoções logo retornam ao ataque;
  4. Em cada turno elas vão notar diante de seus olhos um objeto digno de sua atenção. Não há mal que não ofereça incentivos. A Avareza promete dinheiro; Luxúria, variado sortimento de prazeres; a Ambição, um manto roxo[1] e aplausos, e a influência que resulta dos aplausos, e tudo que essa influência pode fazer.
  5. Vícios o tentam pelas recompensas que oferecem; mas na vida de que falo, você deve viver sem ser pago. Dificilmente bastará uma vida inteira para subjugar nossos vícios e fazê-los aceitar o julgo, inchados por longas indulgências; e ainda menos, se golpearmos nosso breve intervalo por qualquer interrupção. Mesmo cuidado e atenção constantes dificilmente podem trazer uma empreitada a conclusão completa.
  6. Se você vai dar ouvidos ao meu conselho, pondere e pratique isso, – como acolher a morte, ou mesmo, se as circunstâncias recomendarem esse curso, convidá-la. Não há diferença se a morte vem a nós, ou se nós vamos à morte. Faça-se crer que todos os homens ignorantes estão errados quando dizem: “É uma coisa linda morrer a própria morte”[2]. Mas não há homem que não morra sua própria morte. E mais, você pode refletir sobre este pensamento: Ninguém morre exceto em seu próprio dia. Você está jogando fora nada de seu próprio tempo; porque o que você deixa para trás não pertence a você.

Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.

[1] Símbolo de poder estatal,  cargo público relavante.

[2] Talvez a ideia inversa de “viver a própria vida”. Significa “morrer quando chega o devido tempo”, e é o argumento do homem comum contra o suicídio. Entretanto, talvez sugira o assunto da próxima carta.

Carta 32: Sobre progresso

A carta 32 é curta mas seu ensinamento é profundo e simples.
Sêneca nos pede para continuar no curso do progresso e não desviar para modismos, novos começos ou para atividades menos importantes.

Lembra que para as coisas realmente importantes não temos um prazo determinado por terceiros e nos enganamos achando que temos muito tempo sobrando, o desperdiçamos e acabamos por não realizar aquilo que importa.

Nós dividimos a vida em pequenos pedaços, e a desperdiçamos. Apresse-se adiante, então, querido Lucílio, e reflita o quanto aceleraria sua velocidade se um inimigo estivesse nas suas costas, ou se suspeitasse que a cavalaria estivesse se aproximando e pressionando fortemente em seus passos durante uma fuga.” (XXXII, 2-3)

Então pensemos na celebre frase do compositor Duke Ellington: “Não preciso de tempo, preciso de um prazo limite“.

(Imagem:  O Juramento dos Horácios por Jacques-Louis David)


 

XXXII. Sobre progresso

Saudações de Sêneca a Lucílio.  

  1. Eu tenho perguntado sobre você, e perguntando a todos que vem da sua parte do país, o que você está fazendo, e onde está gastando seu tempo, e com quem. Você não pode me enganar; porque eu estou acompanhando. Viva como se tivesse certeza de que receberei notícias de suas ações, ou melhor, como se tivesse certeza de que eu as vejo. E se você se perguntar o que particularmente me agrada do que eu ouço, é que eu não ouço nada, que a maioria daqueles que eu pergunto não sabem o que você está fazendo.
  2. Esta é uma boa prática – abster-se de associar-se a homens de outra estampa e de outros objetivos. E estou realmente confiante de que você não pode ser corrompido, que você vai manter o seu propósito, mesmo que a multidão o cerque e procure distraí-lo. O que, então, está em minha mente? Não tenho medo de que o alterem; mas tenho medo de que possam retardar seu progresso. E muito mal é feito por quem te atrasa, especialmente porque a vida é tão curta; e a tornamos ainda mais curta por nossa instabilidade, por fazer sempre novos começos na vida, agora um e depois imediatamente outro. Nós dividimos a vida em pequenos pedaços, e a desperdiçamos.
  3. Apresse-se adiante, então, querido Lucílio, e reflita o quanto aceleraria sua velocidade se um inimigo estivesse nas suas costas, ou se suspeitasse que a cavalaria estivesse se aproximando e pressionando fortemente em seus passos durante uma fuga. É verdade; O inimigo está realmente pressionando você; você deve aumentar a sua velocidade e fugir e chegar a uma posição segura, lembrando-se continuamente que é nobre completar sua vida antes da morte chegar, e então esperar em paz o quinhão restante do seu tempo, não reivindicando nada para si mesmo, uma vez que você já está em posse de uma vida feliz; pois tal vida não se torna mais feliz por ser mais longa.
  4. Oh, quando será que saberá que o tempo não significa nada para você, quando está calmo e sereno, despreocupado com o amanhã, porque está a gozar a sua vida ao máximo? Você sabe o que torna os homens gananciosos pelo futuro? É que ninguém se encontrou ainda. Seus pais, com certeza, pediram outras bênçãos para você; mas eu mesmo rezo mais para que possa desprezar todas as coisas que os seus pais desejaram para você em abundância. Suas orações saqueiam muitas outras pessoas, simplesmente para que você possa ser enriquecido. Tudo o que eles pedem para você precisará ser removido de outra pessoa.
  5. Eu oro para que você possa ter tal controle sobre si mesmo que sua mente, agora abalada por pensamentos errantes, possa finalmente descansar e ser firme, para que ela possa estar contente com ela mesma e, alcançar uma compreensão do que seja verdadeiramente bom, – e isso estará em nossa posse tão logo tenhamos este conhecimento, – que não há necessidade de anos adicionais. Aquele que finalmente superou todas suas necessidades, aquele que atingiu sua dispensa honrosa e é livre, aquele ainda viverá depois que sua vida foi concluída.

Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.

Pensamento do Dia #23: Sobre força bruta e cérebros

O pensamento do fim de semana é sobre atividade física:

Sêneca diz em sua Carta 15: “Sobre força bruta e cérebros

Há exercícios curtos e simples que cansam o corpo rapidamente, e assim economizam nosso tempo; E o tempo é algo do qual devemos manter estrita conta. Estes exercícios são correr, levantar pesos e saltar, saltos altos ou saltos largos. Selecione para praticar qualquer um destes, e você vai perceber ser simples e fácil. Mas o que quer que você faça, volte logo do corpo à mente. A mente deve ser exercitada dia e noite, pois é alimentada pelo trabalho moderado.

É claro que eu não ordeno que você esteja sempre curvado sobre seus livros e materiais de escrita; a mente necessita de variedade, – mas uma variedade de tal natureza que não seja irritante, mas simplesmente branda. E esta forma de exercício não precisa ser atrapalhada pelo tempo frio ou quente, ou mesmo pela velhice. Cultive esse bem que melhora com os anos.

Ou ainda Sêneca no ensaio Sobre a tranquilidade da Alma

Devemos tomar caminhadas na natureza para que a mente possa ser alimentada e atualizada sob ar livre e a respiração profunda.

(imagem Casal caminhado  por Vincent van Gogh)

Leia mais em:

 

Pensamento do Dia #08: (Carta 22: Sobre a Futilidade de Meias Medidas)

Esteja satisfeito com o negócio ao qual você se dedicou, ou, como prefere que as pessoas pensem, o negócio que lhe foi imposto. Não há nenhuma razão pela qual você deva estar lutando para mais; se o fizer, perderá toda a credibilidade, e os homens verão que não foi uma imposição. A explicação usual que os homens oferecem é errada: “Eu fui compelido a fazê-lo, suponho que era contra minha vontade, eu tinha que fazê-lo.” Mas ninguém é obrigado a perseguir a prosperidade à velocidade máxima;

Dos negócios, no entanto, meu caro Lucílio, é fácil escapar, basta você desprezar suas recompensas. Nós somos retidos e impedidos de escapar por pensamentos como estes: “O que, então? Deixarei para trás estas grandes oportunidades? Devo partir no momento da colheita?  Assim, os homens deixam tais vantagens com relutância; eles amam a recompensa de suas dificuldades, mas amaldiçoam as dificuldades em si. Procure na mente daqueles que lamentam o que já desejaram, que falam em fugir de coisas que não podem deixar de ter; você vai compreender que eles estão se demorando por vontade própria em uma situação que eles declaram achar difícil e miserável de suportar.

É assim, meu caro Lucílio; existem alguns homens que a escravidão mantém presos, mas há muitos mais que se apegam à escravidão.

Continue lendo “Pensamento do Dia #08: (Carta 22: Sobre a Futilidade de Meias Medidas)”

Carta 2: Sobre a falta de foco no Estudo

 
 
Sêneca fala sobre a falta de foco, tanto no estudo e leitura como em viagens de forma indiscriminada.  Começa a série de citações de Epicuro, já que tenta trazer Lucílio do epicurismo para o estoicismo: “Não é o homem que tem pouco, mas o homem que anseia por mais, quem é pobre. … Você pergunta qual é o limite adequado para a riqueza? É, primeiro, ter o que é necessário e, segundo, ter o que é suficiente.
 
(imagem Godfrey Kneller, A Scholar in His Study, about 1668)
 
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II. Sobre a falta de foco na leitura

Saudações de Sêneca a Lucílio.

1. Julgando pelo que você me escreve e pelo que eu ouço, eu estou formando uma boa opinião a respeito de seu futuro. Você não corre para cá e para lá e se distrai mudando sua morada; pois tal inquietação é o sinal de um espírito desordenado. A principal indicação, na minha opinião, de uma mente bem ordenada é a habilidade de um homem em permanecer em seu lugar e ficar bem em sua própria companhia.

2. Tenha cuidado, no entanto, porque esta leitura de muitos autores e livros de qualquer espécie tendem a torná-lo dispersivo e instável. Você deve permanecer entre um número limitado de mestres pensadores e digerir suas obras, para que construa ideias firmes em sua mente. Estar em todo lugar significa também estar em lugar nenhum. Quando uma pessoa gasta todo o seu tempo em viagens ao estrangeiro, ela termina por ter muitos conhecidos, mas nenhum amigo. E a mesma coisa deve ser válida para os homens que não procuram o conhecimento íntimo de um único autor, mas visitam todos de uma maneira precipitada e apressada.

3. O alimento não faz bem e não é assimilado pelo corpo se ele deixa o estômago assim que é comido; nada impede uma cura tanto quanto a mudança frequente de medicamento; nenhuma ferida cicatrizará quando for tentado um bálsamo após outro; uma planta que é movida frequentemente nunca pode crescer forte. Não há nada tão eficaz que possa ser útil enquanto está sendo deslocado. E na leitura de muitos livros há distração. Por conseguinte, uma vez que não é possível ler todos os livros que você pode possuir, é suficiente possuir apenas tantos livros quanto você pode ler.

4. “Mas”, você responde, “eu desejo mergulhar primeiramente em um livro e então em outro”. Eu lhe digo que é o sinal de gula brincar com muitos pratos; pois quando são múltiplos e variados, eles enfastiam, mas não alimentam. Então você deve sempre ler autores de qualidade; e quando você anseia por uma mudança, retroceda àqueles que você leu antes. Cada dia adquira algo que o fortaleça contra a pobreza, contra a morte e contra outros infortúnios; e depois de ter examinado muitos pensamentos, selecione um para ser completamente digerido naquele dia.

5. Esta é minha própria prática; das muitas coisas que eu li, eu reivindico uma parte para mim. A reflexão para hoje é uma que eu descobri em Epicuro. Isso porque eu sou acostumado a entrar até mesmo no campo do inimigo[♦], não como um desertor, mas como um batedor.

6. Ele diz: “É um bem desejável conservar a alegria em plena pobreza.” Na verdade, se estiver satisfeito, não é pobreza. Não é o homem que tem pouco, mas o homem que anseia por mais, quem é pobre. De que importa o que um homem tem guardado em seu cofre, ou em seu armazém, quão grandes são os seus rebanhos e quão gordos são os seus dividendos, se ele cobiça a propriedade do seu vizinho e não conta os seus ganhos passados, mas as suas esperanças de ganhos vindouros? Você pergunta qual é o limite adequado para a riqueza? É, primeiro, ter o que é necessário e, segundo, ter o que é suficiente.

Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.


[♦] Estoicismo em oposição ao Epicurismo.