Na Carta 25 Sêneca fala sobre mudança e do árduo trabalho que esta sempre requer. Discute com Lucílio sobre dois amigos em comum – um velho, um jovem, ambos precisando de alguma correção para colocar suas vidas de volta nos trilhos.
Começa com algo óbvio que infelizmente foi esquecido nos tempos atuais: “Tomarei toda liberdade e franqueza, porque eu não amo uma pessoa se não estou disposto a ferir seus sentimentos.” (XXV, §1) Hoje, muito acreditam que “sentimentos” dos outros são sagrados e o bem supremo, preferem manter o outro em erro, sabendo que em breve sofrerão do que corrigí-los.
Podemos ou devemos tentar mudar outra pessoa? Sêneca continua dizendo que depende – o contexto é tudo e a mesma abordagem não vai funcionar em todo os casos. Então, quais são os contextos mais importantes a considerar, e quando é o momento certo para forçar uma mudança ao invés de esperar?
“Não sei se farei progressos; mas prefiro não ter êxito a não ter fé”.
Essa é uma daquelas frases que descrevem ou melhor moldam o estoicismo e seu modo de viver. É mais importante ter fé e esforçar-se em direção ao seu objetivo do que realmente alcançá-lo.
No texto Sêneca retorna ao tema de se afastar da multidão das cartas 7 e 11 onde ele menciona que é ruim estar sozinho se você não for virtuoso o suficiente. Nesta carta ele esclarece as coisas.
“O momento em que você deve antes de mais nada se retirar em si mesmo é quando você é forçado a estar em multidão.“ Sim, desde que você seja um homem bom, tranquilo e autocontrolado; caso contrário, é melhor você se retirar em uma multidão a fim de ficar longe de si mesmo. Sozinho, você está muito perto de um patife. (XXV, §7)
XXV. Sobre a mudança
Saudações de Sêneca a Lucílio.
1. Em relação a estes dois amigos nossos, devemos avançar em linhas diferentes. As falhas de um devem ser corrigidas, as do outro devem ser esmagadas. Tomarei toda liberdade e franqueza, porque eu não amo uma pessoa se não estou disposto a ferir seus sentimentos. “O que”, você diz, “você espera manter alguém de quarenta anos sob sua tutela? Considere sua idade, quão calejado ele é agora, impossível de ser modificado. Tal homem não pode ser remodelado, somente mentes jovens são moldadas!”
2. Não sei se farei progressos; mas prefiro não ter êxito a faltar com meu dever. Você não precisa se desesperar a curar homens doentes, mesmo quando a doença é crônica, se você apenas se mantiver firme contra o excesso e forçá-los a submeter-se a muitas coisas contra a vontade deles. Quanto ao nosso outro amigo, também não estou suficientemente confiante, exceto pelo fato de que ele ainda tem um sentimento de vergonha suficiente para ruborizar-se por seus pecados. Essa modéstia deve ser fomentada: enquanto persistir em sua alma, haverá espaço para a esperança. Mas quanto a este seu veterano, acho que devemos tratar com mais parcimônia, para que ele não fique desesperado.
3. Não há melhor momento para se aproximar dele do que agora, quando ele tem um intervalo de descanso e parece que corrigiu suas falhas, pois se assemelha a um homem reconvertido. Outros foram enganados por essa intermitência virtuosa da parte dele, mas ele não me engana. Tenho a certeza de que essas falhas voltarão, por assim dizer, com juros compostos, pois estou certo de que estão em suspensão, mas não ausentes. Vou dedicar algum tempo ao assunto e tentar ver se algo pode ou não ser feito, mas só depois de experimentar saberei se pode ou não conseguir-se algum sucesso.
4. Mas você, como de fato está fazendo, mostra que é corajoso: alivia sua bagagem para a marcha. Nenhuma de nossas posses é essencial. Voltemos à lei da natureza, de acordo com ela as riquezas são disponibilizadas para nós. As coisas que realmente precisamos são gratuitas para todos, ou então baratas, a natureza almeja apenas pão e água. Ninguém é pobre de acordo com este padrão. Quando um homem limita seus desejos dentro destas fronteiras, pode desafiar a felicidade do próprio Júpiter, como diz Epicuro. Devo inserir nesta carta um ou mais de seus ditos:
5. “Faça tudo como se Epicuro estivesse observando você.” Não há nenhuma dúvida real de que é bom para todo homem ter designado um guardião sobre si mesmo e ter alguém que possa olhar para cima, alguém que possa considerar como uma testemunha de seus pensamentos. É, de fato, mais nobre viver da forma como você viveria se estivesse sob os olhos de algum homem bom, sempre ao seu lado, mas, no entanto, estou satisfeito se você apenas agir, em tudo o que fizer, como você agiria se alguém qualquer estivesse o observando, porque a solidão nos induz a todos os tipos de vícios.
6. E quando você tiver progredido tanto que tenha respeito por si mesmo, você pode dispensar seu assistente; mas até então, defina como um guardião sobre si mesmo a autoridade de algum homem, seja o grande Catão ou Cipião ou Lélio ou qualquer homem em cuja presença até mesmo patifes degenerados reprimiriam seus vícios. Enquanto isso, você deve se empenhar em fazer de si mesmo o tipo de pessoa em cuja companhia você não ousaria pecar. Quando este objetivo estiver cumprido e você começar a nutrir por si próprio alguma estima, gradualmente permitirei que você faça o que Epicuro, em outra passagem, sugere: “O momento em que você mais deveria se retirar em si mesmo é quando você é forçado a estar entre a multidão.”
7. Você deve se fazer de um naipe diferente da multidão. Portanto, embora ainda não seja seguro retirar-se para a solidão, procure certos indivíduos; pois qualquer um é melhor em companhia de alguém, não importa quem, do que só em sua própria companhia. “O momento em que você deve antes de mais nada se retirar em si mesmo é quando você é forçado a estar em multidão.” Sim, desde que você seja um homem bom, tranquilo e autocontido; caso contrário, é melhor você se retirar em uma multidão a fim de ficar longe de si mesmo. Sozinho, você está muito perto de um homem sem caráter.
Mantenha-se Forte. Mantenha-se Bem.